segunda-feira, 24 de dezembro de 2007
Poema de Natal
Para isso fomos feitos:
Para lembrar e ser lembrados
Para chorar e fazer chorar
Para enterrar os nossos mortos –
Por isso temos braços longos para os adeuses
Mãos para colher o que foi dado
Dedos para cavar a terra.
Assim será a nossa vida:
Uma tarde sempre a esquecer
Uma estrela a se apagar na treva
Um caminho entre dois túmulos –
Por isso precisamos velar
Falar baixo, pisar leve, ver
A noite dormir em silêncio.
Não há muito que dizer:
Uma canção sobre um berço
Um verso, talvez, de amor
Uma prece por quem se vai –
Mas que essa hora não esqueça
E por ela os nossos corações
Se deixem, graves e simples.
Pois para isso fomos feitos:
Para a esperança no milagre
Para a participação da poesia
Para ver a face da morte –
De repente nunca mais esperaremos...
Hoje a noite é jovem; da morte, apenas
Nascemos, imensamente.
Vinicius de Moraes
sábado, 22 de dezembro de 2007
O Velho, o Menino e o Burro
Passaram algumas pessoas e comentaram:
– Que gente boba!
Andando tanto, quando podiam ser levados pelo burro!
O velho, então, montou o menino no burro e foi ele mesmo puxando o cabresto.
Passaram outras pessoas e disseram:
– Que absurdo! Um velho tão velho andando e o menino no bem-bom!
O menino desmontou, o velho subiu e foi conduzindo o burro.
Outros passaram e disseram:
– Que horror!
Um menino tão pequeno andando
o velho descansando em cima do burro!
O velho, então, pôs o menino com ele em cima do burro, e lá foram eles para a feira.
Mas, pessoas que também iam pelo caminho resmungaram:
– Como tratam mal um burro magro!
Ter de levar tamanho peso!
O velho e o menino desceram do burro e
passaram a carregá-lo nas costas.
E aí, todos os que passavam riam deles e diziam
– Mas que burrice! Afinal, para que serve um burro?
Moral da história:
Quem quer agradar todo mundo no fim não agrada ninguém.
terça-feira, 18 de dezembro de 2007
Assim continuaram...
Aprontou-se com a presteza de sempre e desta vez trocou o nó Windsor da gravata por um cruzado. A camisa branca, combinando com as paredes, foi logo coberta pelo paletó escuro. Sentou-se outra vez à beira da cama para uma oração a Nossa Senhora das Estradas, e abriu a esmo a coletânea de Jose Asunción Silva, que, a seu ver, era parte da liturgia diária.
Desceu as escadas seguindo o rastro deixado pela ultima fornada de arepas, que seriam devoradas pelos filhos. Pensava em Gaitan, no Bogotazo, e como as coisas tinham melhorado; e também piorado. Estava doido para passar as férias em San Gil novamente. Sua mulher, Sara, arquétipo de uma tela de Botero, estava sentada com três das criancas à esquerda da cabeceira, derretendo queijo no chocolate quente. Não tinha muito tempo, era hora de ir ao Supremo, pensar nas sinecuras.
(Continuem!!!! Mandem história nos comentários...)
Assim comecei...
Esticou a mão e alcançou os pequenos papéis deixados na mesa ao lado da cama pela filha Clara, sua bênção, a mais bonita das quatro, a mais dedicada dos sete que vingaram. As imagens impressas de Santa Dinfna e Santo Pelegrino e uma foto de Clara, além dos dentes de Ronderos, quebravam a uniformidade branca e insana do quarto. Eram sua platéia bizarra.
quarta-feira, 5 de dezembro de 2007
segunda-feira, 3 de dezembro de 2007
Incentivo é bom e eu gosto
Dessa vez, as responsáveis foram a Cris e a Guta, pelos elogios, e uma lágrima fujona. Eu me lembrei do início de tudo: uma dor de arrebentar a carcaça, de morder edredom para não soluçar, de rezar para morrer. Hiperbólico assim mesmo. Como a Guta definiu no seu Migrante Digital, foi um diário antienlouquecimento, conforme os textos saíam, o desespero era domesticado. A maioria das postagens foi para o arquivo porque não gosto de reler.
Hoje, porém, reli. Coisa de estado de espírito.
sexta-feira, 23 de novembro de 2007
Carta do amor eterno
Caldos na infância
Eu tinha 6 anos quando me mudei da Ilha para Copacabana. Na Ilha, entrávamos no mar tranqüilamente, pois não há ondas na Baía da Guanabara, exceto um dia ou outro no ano, quando a natureza faz umas marolas por lá.
Copacabana era forte para mim, sempre assustada. Pois meu pai entrou comigo e com o meu irmão no mar e de repente saiu fora e nos deixou lá. Fiquei meio desesperada olhando para ele na areia. Adhemar, dois anos mais velho, ao meu lado, batendo as perninhas para não se afogar, como eu. Então, decidimos que tínhamos que sair, porque meu pai não iria nos pegar, sabíamos.
Levei muito caldo, comi muita areia, mas aprendi a entrar no mar e sair.
Como um bicho que ensina as crias, meu pai mostrou o caminho e os perigos naquele dia e nunca mais repetiu a lição.
quinta-feira, 22 de novembro de 2007
Noite de brincadeira
- Não voltou subir, não. Vocês podem interfonar.
Entreolharam-se. E agora? Interfonaram.
- É Ana, Lúcia e Claudia. Pode escolher.
Grudadinhas, quase de mãos dadas, como pequenos irmãos assustados, subiram sem respirar. Uma cara desconhecida, é óbvio, as esperava lá no alto. Tudo muito claro. Holofotes acesos como aqueles de filmes antigos que detectam fugas de penitenciárias.
- Ele está naquela sala, podem ir lá.
A dupla se embrenhou para uma sala contígua, vazia, para esconder a cabeça como avestruz e ficar ali até morrer de vergonha.
- Não, naquela outra, ele está lá. Podem ir.
As ordens foram plenamente acatadas pelas crianças travessas e apenas adiaram os planos imediatos de suicídio. Ai, meus sais.
- Entra lá, você que é amiga de Orkut.
- Não sou, não.
- Como????? Não é??? E o que a gente está fazendo aqui. Além de não sermos convidadas, nem conhecemos o aniversariante que vamos ter que cumprimentar e dar beijinho agora??? Vou voltar. Vou dizer que a gente errou de porta, que estava procurando a livraria e se perdeu.
- Não, vamos lá, mas vai você na frente.
Que roubada. Não dava mesmo para recuar, éramos observadas.
Com o milagre da transmutação do sangue em adrenalina, entramos. Quatro, apenas quatro convidados.
(CONTINUA...)
sábado, 17 de novembro de 2007
Só 10%????
terça-feira, 13 de novembro de 2007
Mudei
A mesma ilusão
Da égua que sorve a água pensando sorver a lua.
De te pensar me deito nas aguadas
E acredito luzir e estar atada
Ao fulgor do costado de um negro cavalo de cem luas.
De te sonhar, tenho nada,
Mas acredito em mim o ouro e o mundo.
De te amar, possuída de ossos e abismos
Acredito ter carne e vadiar
Ao redor dos teus cismos. De nunca te tocar
Tocando os outros
Acredito ter mãos, acredito ter boca
Quando só tenho patas e focinho.
De muito desejar altura e eternidade
Me vem a fantasia de que Existo e Sou.
Quando sou nada: égua fantasmagórica
Sorvendo a lua n'água.
(Hilda Hilst)
quarta-feira, 7 de novembro de 2007
Maggie foi cobrada pela Patrícia Evans
so get away from me.
I mean,
COME HERE.
Wait, no,
that's too close,
give me some space
it's a big country,
there's plenty of room,
don't sit so close to me.
Hey, where are you?
I haven't seen you in days.
Whadya, having an affair?
Who is she?
Come on,
aren't I enough for you?
God,
You're so cold.
I never know what you're thinking.
You're not very affectionate.
I mean,
you're clinging to me,
DON'T TOUCH ME,
what am I, your fucking cat?
Don't rub me like that.
Don't you have anything better to do
than sit there fawning over me?
Don't you have any interests?
Hobbies?
Sailing Fly fishing
Archeology?
There's an archeology expedition leaving tomorrow
why don't you go?
I'll loan you the money,
my money is your money.
my life is your life
my soul is yours
without you I'm nothing.
Move in with me
we'll get a studio apartment together, save on rent,
well, wait, I mean, a one bedroom,
so we don't get in each other's hair or anything
or, well,
maybe a two bedroom
I'll have my own bedroom,
it's nothing personal
I just need to be alone sometimes,
you do understand,
don't you?
Hey, why are you acting distant?
Where you goin',
was it something I said?
What
What did I do?
I'm an emotional idiot
so get away from me
I mean,
MARRY ME.
domingo, 4 de novembro de 2007
Volta para o mar, oferenda!
Da cabeça encaracolada do Gláuber saíram idéias geniais como a "Coelhada de Páscoa", que ele mesmo cozinhava no terraço, uma tradição que se foi com a Dani, a mulher que enchia as escadas de colchonetes para fazer um grande tobogã, onde escorregava com nossas crianças. Depois do almoço, chocolates para todos e delírios só para os adultos.
A casa tinha piscina, mas deu infiltração e agora tem mais espaço e um chuveirão. Tudo é bom. Tudo é calculadamente agradável. Ir à casa do Gláuber significa levar idéias e sorrisos embora conosco. Ontem, conversando coisas tristes com a Anna José, ela soltou: "Ah, Ana, esquece, fala assim, ó: 'Volta para o mar, oferenda!'". É isso. A casa do Gláuber é um grande centro de triagem para retornos das oferendas ao mar.
sábado, 3 de novembro de 2007
Travequinha amada
sei que você não é espiritualista nem esotérica, mas tampouco veste o fardão do materialismo científico, o que lhe faz ter uma posição pertinente a respeito de fatos bobos desse nosso cotidiano que ora conto, ora guardo na preguiça amiga.
Hoje pensei muito em você, nas suas opiniões e na sua risada com o que vou narrar. Estou de plantão, leia-se trancafiada dentro de casa, vendo sites, escarafunchando jornais, cuidando de uma boa cobertura para o nascimento do segundo filho da Angélica - não se compadeça nem gaste sua verve falando do sistema capitalista que nos suga e destrói nossos sonhos, daqui a pouco vou ver os queridos na casa do Gláuber e isso me basta.
Bom, a rotina do plantão manda acordar cedo para comprar os jornais. Acordei quase que mais cedo que os jornaleiros e fiquei perambulando por Botafogo à espera de uma banca aberta com os jornais do Rio e de SP. Aproveitei para caminhar na praia e dei ainda um pulo na igreja, porque gosto de falar com as imagens. Segurei na mão de um lindo Cristo e saí de lá com aquele dom de "ver" em que você não acredita.
Na volta para a banca, carros estacionados, telefones celulares tocando sem parar, tumulto nas ruas à minha frente às sete e meia da manhã. Fiquei zonza. Tentei respirar, mas tiraram meu ar. Quis me escorar, mas não havia paredes nem chão. Pô, Silvona amiga, você diria, fumar um beque antes do café dá nisso, rapá. Não, sem beques, tô limpa. Flutuei na volta para casa, meninos, famílias inteiras ainda dormiam na calçada. Um garoto cheirava cola, olhou para o alto e me viu. Esticou a mão da garrafa com a droga dentro na minha direção, uma oferenda para mim. Tudo em câmera lenta. Torci muito para chegar logo em casa, eu chorava, e a casa chegou a mim. Mas o que você viu, mulher de Deus?, perguntaria a amiga escritora. Na verdade, nada e tudo. Nada do que eu não sabia e tudo que eu escondia do meu coração. Esse mundo dá pena, Cris, e eu estou cansada de lutar com os seus burgas, amiga.
segunda-feira, 1 de outubro de 2007
Ana Torrent
Ana Torrent é Cria Cuervos e O Espírito da Colméia. Ana é menina. Já foi mulher de Henrique VIII, mas antes teve pena do monstro do Frankenstein e acreditava ter o poder da vida e da morte das pessoas. Quando crianças sempre acreditamos nisso, que somos invencíveis, impossíveis, invisíveis.
segunda-feira, 24 de setembro de 2007
Jorge disse
Suspeito que os homens é que são de Vênus, levando as mulheres a Marte (guerra)..."
Salve, Jorge!
Obrigada pela sabedoria do comentário na postagem "Que dodói, que nada".
domingo, 23 de setembro de 2007
quinta-feira, 13 de setembro de 2007
É COISA NOSSA (1925 -2007)
"Colega de trabalho de Pedro de Lara, Elke Maravilha define o humorista como "um sábio". "Lembro que estava triste após levar uma bronca do Silvio Santos, e o Pedro me disse: "Ah, Elke, tem gente que é tão pobre, mas tão pobre, que só tem dinheiro"."
“Na vida tem que ter estilo. Quem não tem não é isso nem aquilo”.
quinta-feira, 6 de setembro de 2007
O homem dodói (Joaquim Ferreira)
terça-feira, 4 de setembro de 2007
segunda-feira, 3 de setembro de 2007
sábado, 1 de setembro de 2007
Um brinde às cariocas em SP
Internautas, para se atualizarem, passeiem por lá.
quinta-feira, 30 de agosto de 2007
Os silêncios da fala (pelo meu aniversário)
segunda-feira, 27 de agosto de 2007
Do Grande e do Pequeno Amor
«Andas a dormir com alguém?»
«Já não, encontro-te sempre, até nos corpos das outras me farto de ti, o meu amor por ti é tão banal e absoluto que está em todos os corpos, entendes?»
«Perfeitamente. Como é que vamos resolver isto?»
«Porque é que temos de resolver isto? Talvez este amor, esta coisa nossa, seja uma guerra como essas que tu estudas, infinitas, com o sangue e a paz entremeados. E páginas em branco.»
«Somos os dois muito maus na questão das páginas em branco. Se reparares bem é isso.»
«Talvez eu não goste de reparar bem. Acho até que é por isso que preciso de ti; para me irritar contigo porque reparas sempre em tudo o que me escapa.»
«Achas que ainda teremos medo de viver juntos daqui a vinte anos?»
«Não sei. Sei que nos arrependeremos se não tentarmos. Mas não consigo perder o medo.»
«Não tens de perder o medo. O medo faz parte do que somos os dois.»
«Nunca te esqueces de mim quando tens prazer com outras pessoas?»
«Não, e aí está uma coisa difícil de te perdoar.»
(Inês Pedrosa e Jorge Colombo)
O não-amor
segunda-feira, 20 de agosto de 2007
sábado, 18 de agosto de 2007
Manu Chao é "Homens" e tudo de bom
http://br.youtube.com/watch?v=4ZREqrdhFwo&mode=related&search=
quinta-feira, 16 de agosto de 2007
Ah, os poetas portugueses
Não entendo os silêncios
que tu fazes
nem aquilo que espreitas
só comigo
Se escondes a imagem
e a palavra
e adivinhas aquilo
que não digo
Se te calas
eu oiço e eu invento
Se tu foges
eu sei não te persigo
Estendo-te as mãos
dou-te a minha alma
e continuo a querer
ficar contigo.
(Maria Teresa Horta)
segunda-feira, 13 de agosto de 2007
Espera (Eugénio de Andrade)
pesadas, fundas,
esperarei por ti
até que todas as coisas sejam mudas.
Até que uma pedra irrompa
e floresça.
Até que um pássaro me saia da garganta
e no silêncio desapareça.
domingo, 12 de agosto de 2007
Maneiras (Zeca Pagodinho)
Se eu quiser beber eu bebo
Pago tudo que consumo com o suor do meu emprego
Confusão eu não arrumo, mas também não peço arrego
Eu um dia me aprumo, pois tenho fé no meu apego
Eu só posso ter chamego, com quem me faz cafuné
Como o vampiro e o morcego é o homem e a mulher
O meu linguajar é nato, eu não estou falando grego
Eu tenho amores e amigos
De fato tá tudo errado nos lugares onde eu chego
Eu estou descontraído, não que eu tivesse bebido
Nem que eu tivesse fumado pra falar de vida alheia
Mas digo sinceramente, na vida, a coisa mais feia
É gente que vive chorando de barriga cheia
É gente que vive chorando de barriga cheia
sábado, 11 de agosto de 2007
Maternidade da cadela do Zé José
Que cada um cumpra o seu dever
Madrugada de bebedeira total hoje. Caí no sofá e semi-adormeci. Galera que foi comigo queria ir embora. Ele se aproximou. Uns apertos aqui, uma massagem ali, um selinho e a frase ao pé-da-orelha: vai não, fica aqui. Mesmo desmaiada veio a luz. So sorry, já vi esse filme. Fui. Tropeçando em ventos.
sexta-feira, 10 de agosto de 2007
Você me lê?
E lá vem a Clarice. "O que te escrevo não tem começo: é uma continuação. Das palavras deste canto que é meu e teu, evola-se um halo que transcende as frases, você sente? Minha experiência vem de que eu já consegui pintar o halo das coisas. O halo é mais importante que as coisas e as palavras. O halo é vertiginoso. Finco a palavra no vazio descampado: é uma palavra como fino bloco monolítico que projeta sombra. E é trombeta que anuncia."
terça-feira, 7 de agosto de 2007
E se fosse a sua filha?
Não precisou muito para ela reparar que ele não a levava para sair com os amigos dele (olha que ela é bonitona). Começou a furar programinhas básicos, tipo cinema, passeio, e não queria muito contato com a família dela. Só não furava os dias de lesco.
Um amigo dela disse que o moço voluptuoso nunca havia prometido nada, muito pelo contrário, tinha sido claro ao escrever em e-mail sobre uma história de "meu mundo, seu mundo", "gosto de parte sua, mas outra ainda não consigo digerir", coisas assim. Isso quando tentava ser racional. Na paixão, mandava fotinhas, torpedos amorosos, seduzia o tempo todo - apesar da "outra parte" dela, da qual não queria nem chegar perto, como se ela pudesse arrancar pedaços invisíveis de si, libras das suas vivências, sem deixar de ser quem é.
Minha pergunta para homens assim é: e se fosse com sua filha, sua mãe, sua irmã?
Como será que esses tipos iriam se referir a um sujeito que ignora a sutileza dos sonhos dos outros? O mundo é só dividido entre os espertos e os manés? A mulher - ou o homem - que se envolve com indicações de romantismo é apenas otária(o)? O sonhador é um idiota?
Ando meio cansada desse egoísmo emocional.
segunda-feira, 6 de agosto de 2007
Sophia de Mello Breyner Andresen
Dai-nos Senhor a paz que vos pedimos
A paz sem vencedor e sem vencidos
Que o tempo que nos deste seja um novo
Recomeço de esperança e de justiça.
Dai-nos Senhor a paz que vos pedimos
A paz sem vencedor e sem vencidos
Erguei o nosso ser à transparência
Para podermos ler melhor a vida
Para entendermos vosso mandamento
Para que venha a nós o vosso reino
Dai-nos
A paz sem vencedor e sem vencidos
Fazei Senhor que a paz seja de todos
Dai-nos a paz que nasce da verdade
Dai-nos a paz que nasce da justiça
Dai-nos a paz chamada liberdade
Dai-nos Senhor paz que vos pedimos
A paz sem vencedor e sem vencidos
domingo, 5 de agosto de 2007
Por que Cris
quinta-feira, 26 de julho de 2007
O gato de Cheshire
- Poderias dizer-me, por favor, que caminho hei de tomar para sair daqui?
- Isso depende de onde queres chegar! - respondeu o gato.
- Não interessa muito para onde vou... - retorquiu Alice.
- Nesse caso, pouco importa o caminho que tomes - interpôs o gato.
- Desde que chegue a algum lado! - acrescentou Alice.
ORACIÓN DEL PEREGRINO
Hoy llego a Ti, peregrino en busca de tu perdón. Con mi andariego bordón te hallé, al fin, en mi camino. Al volver tras mi destino, sólo te pido, Jesús, que, al irme yo con mi cruz, dejes contigo encerrado mi corazón perdonado, antes que expire la luz.
terça-feira, 24 de julho de 2007
Os sub-30
Trazem menos bagagem, um sorriso mais sincero, um cheiro mais forte, um beijo mais longo, uma pegada mais instintiva ou primitiva, vão mais fundo, famintos que sempre estão. E sorriem a cada milímetro de conquista e com a diversão que é fazer amor.
Consolam mais porque se desnorteiam com a dor, que ainda não entendem bem. Não se importam muito sobre o motivo do choro, só querem que passe logo. Conversam sobre árvores e aventuras. Lêem o mundo sem confusão; não filosofam, apenas descobrem.
quarta-feira, 18 de julho de 2007
Mário de Sá-Carneiro
Um pouco mais de sol - eu era brasa,
Um pouco mais de azul - eu era além.
Para atingir, faltou-me um golpe de asa...
Se ao menos eu permanecesse aquém...
Assombro ou paz? Em vão... Tudo esvaído
Num baixo mar enganador de espuma;
E o grande sonho despertado em bruma,
O grande sonho - ó dor! - quase vivido...
Quase o amor, quase o triunfo e a chama,
Quase o princípio e o fim - quase a expansão...
Mas na minh'alma tude se derrama...
Entanto nada foi só ilusão!
De tudo houve um começo... e tudo errou...
- Ai a dor de ser-quase, dor sem fim... -
Eu falhei-me entre os mais, falhei em mim,
Asa que se elançou mas não voou...
Momentos de alma que desbaratei...
Templos aonde nunca pus um altar...
Rios que perdi sem os levar ao mar...
Ânsias que foram mas que não fixei...
Se me vagueio, encontro só indícios...
Ogivas para o sol - vejo-as cerradas;
E mãos de herói, sem fé, acobardadas,
Puseram grades sobre os precipícios...
Num ímpeto difuso de quebranto,
Tudo encetei e nada possuí...
Hoje, de mim, só resta o desencanto
Das coisas que beijei mas não vivi...
... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ... ...
Um pouco mais de sol - e fora brasa,
Um pouco mais de azul - e fora além.
Para atingir, faltou-me um golpe de asa.
Se ao menos eu permanecesse aquém…
terça-feira, 17 de julho de 2007
Triste
Rádio JB no táxi
Os deuses, as dúvidas...
Pra que amendoeiras pelas ruas?
Para que servem as ruas...
depois de ter você?"
sexta-feira, 13 de julho de 2007
DO TALMUD
"Cuida-te quando fazes chorar uma mulher, pois Deus conta as suas lágrimas. A mulher foi feita da costela do homem, não dos pés para ser pisada, nem da cabeça para ser superior, mas sim do lado para ser igual... debaixo do braço para ser protegida e do lado do coração para ser amada".
Play it again, Sam
sábado, 7 de julho de 2007
É CAMPEÃO!
domingo, 1 de julho de 2007
Meu consolo é Graham Greene
Uma arte
Perdi duas cidades lindas. E um império
segunda-feira, 25 de junho de 2007
Resposta à flor
Estou sofrendo pela falta de um grande amor, falta absoluta e total, nem as palavras me restaram. Estou sofrendo pelos argumentos implacáveis que me foram apresentados na hora do toco, no dia 31 de maio. Sei que vai passar. Sei que tudo será lavado. Sei que meu corpo vai cansar de sofrer. Tudo isso à minha revelia. É assim e acabou.
Concordo com você sobre a ratoeira. Eu sabia dos riscos, tive medo, tanto que avisei a ele que eu iria me estrepar, e ele me disse que seguraria a minha mão para me ajudar. Claro que não foi assim. Quando há problemas, todo mundo quer livrar sua pele. Eu entendo. Usou a mão que me dava para se segurar inteiramente. Eu ainda estou em queda livre, rumo ao extremo Sul, que você mencionou. Vou lá conversar com o coisa-ruim, até voltar, como Orfeu, da longa jornada: em segurança, sim, mas de mãos abanando.
Enfim, queridona, tenho que seguir em frente, eu sei. Só peço máxima vênia pela situação. Preciso de ajuda para não enlouquecer na dor da falta que ele me faz. Peço ajuda para não perder a minha dignidade, para não meter os pés pelas mãos, para não cair na sarjeta.
Você é maravilhosa, uma grande querida, uma pessoa em quem confio nas palavras, no discernimento, na sabedoria.
Um beijo grande e bom dia.
E-mail de uma amiga sábia
Andei lendo teu blog, e não consegui resistir. Aponte um ser humano - unzinho só -, de Jesus Cristo a George Bush, freira ou puta, gênio ou bucéfalo, que não seja tão simplesmente o teu patchwork, os tais retalhinhos de lembranças. Ando meio Pollyanna, mas a questão é que ando me convencendo de que só por isso, só por sermos um receptáculo quase sagrado de memórias que vamos acumulando e transmitindo pela vida, pros nossos amigos queridos, pros nossos filhos, qual antenas bêbadas, é que essa lida vale alguma pena - no nosso caso específico, ainda tem o raio do leitor.
Não tivesse eu descido ao inferno e, depois de anos, ter decidido voltar à superfície dos mortais (a escalada ainda não acabou, como bem sabes), eu jamais poderia ter a convicção que hoje tenho ao te dizer que isso vai passar. Não tivesse trazido em si nenhum outro aprendizado sobre minha própria alma, a jornada ao extremo Sul em companhia de um traste já teria valido só por hoje eu poder dizer à amiga querida que agora chora, sem nenhuma dúvida, plagiando lá o amigo do Rei Davi, "isso também vai passar".
Vai passar como passa cada segundo. E digo isso com a constatação de que aquilo que me ia no coração ao começar a te escrever esse e-mail já não vai mais. Já estou no terceiro parágrafo e me dou conta nesse exato momento de que o relato que fiz no segundo parágrafo me remeteu a um monte de lembranças que me atropelam agora. Lembranças de uma dor em estado puro; de uma dor no corpo e na alma; de uma dor que não tem nome, nem forma; de uma dor que levou meses pra parar de doer; de dor, só dor, que, adivinhe?, passou. Não passou ainda o que processei a partir disso, é verdade.
Vai passar como passaram aqueles momentos absurdos que vivemos quando ainda não sabemos que coisa é essa de ser mulher; quando não sabemos por que diabos nosso corpo sangra, todo maldito mês, sem que a gente tenha feito nenhuma travessura; quando não sabemos direito o que fazer com aquela língua que nos invade a boca no primeiro beijo; quando não sabemos direito como é que é essa história do sujeito enfiar um pedaço do corpo dele no corpo da gente. Vai passar como passou a dor de quando sofremos de amor pela primeira vez e temos a certeza absoluta de que o mundo vai acabar.
Dá licença, agora, amiga, mas não temos mais o direito de achar que não sabemos com o que estamos lidando. Sabemos exatamente que aquele queijinho bacana, amarelinho, furadinho, igual a de desenho animado, estava num raio de uma ratoeira. O que temos que precisamos fazer agora é buscar na alma por que diabos sempre ignoramos a ratoeira só pelo prazer de pegar o tal queijinho ou, se Deus existir, encontrar algum queijinho fora do raio da retoeira.
O problema é que isso também vai passar, de novo plagiando o amigo do rei, como passaram momentos deliciosos, daqueles de nos trazer lágrimas aos olhos quando lembramos ou daqueles de matar os amigos de rir quando contamos.
Agora, já no sexto parágrafo, me lembro de uma noite, eu, sozinha, na Ilha de Capri, num hotel encarapitado na encosta à beira da Baía de Nápoles, bebendo vinho, Sinatra no ouvido. Não amava ninguém, não tinha saudade de ninguém. À minha frente, o mar, enorme, e uma tempestade caindo sobre Nápoles, com raios despencando na cidade. Isso, à direita. Porque à esquerda o sol se punha, displicente, em céu de brigadeiro, rosa, rosa, como se não fosse com ele. Era uma tempestade localizada, como costumam ser as tempestades. O melhor de tudo é que isso me veio à cabeça agora, imediatamente depois de eu ter passeado pelo primeiro amor errado e pelo meu passado no inferno. Explicação, não tenho. Só sei que foi assim, como diria o Chicó do bom Suassuna. Seqüelas? Acho que não. Prefiro chamá-las de... é..., bem..., não sei bem como chamá-las.
O que ainda não passou, amiga, é o que virá no segundo seguinte. E, pra piorar, no momento exato em que eu escrevia "momento seguinte", ele já não existia mais, já tinha se transformado imediatamente em momento passado, em memória, em parte do meu próprio patchwork, que vou exibindo aí pelos botequins, pela minha narrativa, pela força da grana que ergue e destrói coisas belas... ih, me empolguei. Enfim, babe, é simples e óbvio assim.
Não vou encerrar com um discursozinho patético sobre a esperança no que virá - "virá, que eu vi", diria o baiano metido a Einstein (ih, é a segunda referência a Caê, ando péééééssima). Mas, na boa, confessa com tua boca que a nossa absoluta falta de informação sobre o próximo segundo, o que está imediatamente à nossa frente, o que ainda não veio e o que ainda não virou memória, não constitui o que de mais sagrado essa lida nos dá?
Cuide-se. Tô aqui a qualquer hora.
Beijo grande.
domingo, 24 de junho de 2007
Tudo como dantes (tá ficando chato)
A sensação de solidão mesmo entre amigos amados é de enlouquecer. Eles cantam, embalam, ritualizam as exéquias, direcionam os lamentos, sofrem e xingam com e por você. Queridos que dão as mãos. Mas é verdade o que está escrito embaixo: a água dos olhos nunca tem sono. Quando eles se distraem, a dor toma conta, e não há analgésico. É apertar os dentes, enrijecer a musculatura e esperar passar. Pergunto ansiosa quais serão as seqüelas, porque nada dói tanto impunemente.
E, sobre as passagens dos passamentos, aí vai uma historinha. Conta uma lenda que, um dia, o rei David pediu ao joalheiro real que lhe desenhasse um objeto que fosse útil tanto na adversidade quanto na prosperidade. Sem idéias, consultou-se com um sábio, que lhe disse para fazer um anel e nele escrever as palavras "isto também passará". Dessa forma, quando a vida fosse um mar-de-rosas, a jóia evitaria que o rei ficasse muito cheio de si e, portanto, vulnerável aos baques. Porém, quando uma tragédia o atingisse, contemplaria a inscrição e apenas esperaria.
quarta-feira, 13 de junho de 2007
No dia de Santo Antônio
Fui só objeto de desejo? Não sei, mas é bom sentir o desejo de um homem, vê-lo irracional, sem pragmatismos, sem resistências, bicho solto buscando só prazer. Dar e ter.
Minha casa parece um santuário de Santo Antônio. Velas rosas, azuis e roxas colorem os cômodos. Apelo para tudo porque quero esquecimento, quero de volta alegria e paz. Eu e Claudia coletamos simpatias para atrair o bom, abrir as portas para o novo. Muito mel, maçã, fitinhas. Nada de maldade tipo tirar o jesusinho do colo do santo nem afogar nem pôr de cabeça pra baixo. Somos só coisas boas. Queremos saúde e menos trastes nos nossos caminhos.
Ontem, fui receber a bênção no convento porque hoje é dia de folguedos e estará lotado. Chorei. Não é a primeira vez que choro nessa igreja, a energia dos devotos impressiona e até os menos sensíveis se emocionam. Há paixão e fervor que grudam em você. Saí de lá ressuscitada, entendendo o sentido dos milagres.
sábado, 9 de junho de 2007
Cuidado ao pisar, são meus sonhos
W. B. Yeats
Had I the heavens’ embroidered cloths,
sexta-feira, 8 de junho de 2007
Recaída ao início da tarde
el que es necesario enterrar, com humor y coraje?
El dolor, según dicen, pasa pronto;
la vida, em cambio, habrá de concedernos la impossibilidad
de más daños, dulce daños.
(Juan Gustavo Cobo)
Rubro-negra homenageia
Fui Fluminense até meus cinco anos. Agora sou Flamengo até morrer. Mas tenho um carinho especial por esse time. Meu irmão me levava ao Maracanã para ver os jogos, cheguei a usar a camisa da cor estranha, para evitar a transparência da minha blusa branca debaixo de uma chuva terrível, numa decisão Fu X Vasco, creio que em 80 - ou 81. Namorei tricolores. Muitos dos meus amigos que mais me aconchegam torcem pelo Flu. Então, em homenagem a eles, e para evitar que este blog vire um muro de lamentações sentimentais, reproduzo texto do Garamblog, do tricolor chato, escritor bacana (leiam 'Eu, Deus') e amigo querido Sidney Garambone.
E o Fluminense?
Quinta à tarde o Brasil mais jovem entendeu o que é o Fluminense. E o Brasil mais velho lembrou quem era o Fluminense. As imagens do estádio das Laranjeiras. Ou de Laranjeiras para os cariocas, pois no Rio o bairro que já foi fazenda de laranjas não é conhecido como “as Laranjeiras”. Simplesmente mora-se em Laranjeiras.
As imagens da torcida ocupando o gramado, como um MST polido e educado, dividindo em lotes a intermediária, meia-lua e grande área. Pulando, pisando, levando grama para casa.
Os jogadores eram detalhes. O treinador era um detalhe. Como algum quadro impressionista, as pinceladas misturaram na foto torcida, atletas, cartolas e cimento.
Cimento antigo, secular, que já viu todos os times grandes brasileiros jogando contra o Fluminense antes e depois do Maracanã. Já viu Seleção e jogo de Terceira Divisão. Timinho e Timão.
Laranjeiras, por um dia, voltou a ganhar os holofotes do Brasil. E os torcedores tricolores também. Não foi vitória heróica. Hoje, com calma, fica mais fácil entender o jogo em Florianópolis. O Figueirense se preparou para tudo, menos para um gol de Roger. Ninguém se preparou para o gol de Roger.
Só Roger.
A torcida levou um nocaute daqueles. Mário Sérgio também. O time então, nem se fala. Não foi uma pressão daquelas que a gente conhece bem. Não houve defesa milagrosa, como querem os assessores de imprensa. A juventude do Figueirense pesou. E o resto, o vizinho Gustavo Poli já descreveu de forma rodriguiana.
O avião decolou e pousou em outro ícone carioca do passado. O aeroporto Santos Dumont. A festa começou lá e acabou no velho estádio da rua Álvaro Chaves. Time centenário, com mais títulos cariocas, o Fluminense virou o século se reinventando.
Sem champanhe.
Mas com muito Bordeaux, da cor da camisa.
Tu és tudo, Suassuna
Cris, sábia, me falou do escritor Ariano Suassuna, um patrimônio nacional. Em recente programa na TV, Suassuna, no turbilhão das comemorações pelos seus 80 anos (próximo dia 16), se mostra surpreso: "Imagina o que não vão fazer nos meus 160!" Conversamos sobre Suassuna, nascido na Paraíba, mas morador de Recife desde a adolescência. Defensor da cultura nacional, suas obras já foram traduzidas para inglês, francês, alemão e até polonês, ele, porém, nunca saiu do Brasil. As explicações estão aí, numa entrevista a dada à Folha de S. Paulo, em 2003:
Folha - Você nunca viajou para fora do Brasil. Por quê?
Suassuna - É por isso que sou um viajante imaginário, como o narrador do meu romance. Não tenho que viajar, não. Conheço a Rússia melhor do que muito russo, através simplesmente de Dostoiévski, Gogol e Tolstói.
Folha - Certa vez uns colegas queriam mandá-lo para a França...
Suassuna - Foi, foi. Eles conseguiram uma bolsa do governo francês para eu estudar. Quando já estava quase tudo preparado, um deles disse: você tem que ir, porque um escritor brasileiro não conhece o Brasil se não fizer um curso na Europa. Aí eu disse: pois eu não vou mais, não. O gringo que quiser me conhecer agora tem que vir aqui, porque eu não vou lá. Eu era muito jovem quando disse isso, e não é que não se cumpriu, isso? Eu não fui lá e tem gringo que vem por aí para falar comigo. Esse orgulho eu tenho.
Folha - Existe algum país que você gostaria de conhecer?
Suassuna - Se Portugal e Espanha fossem ali em Alagoas, eu iria. Mas são muito longe.
quinta-feira, 7 de junho de 2007
Vaca, muito prazer
Sou que nem cangambá: não corro nem dou lugar
Raimunda não foi para a escola porque seu pai achava que ela queria aprender a escrever para mandar cartinhas de amor aos moços. Tinhosa, mostrou que toda dominação é burlada facilmente. "Eu sou que nem cangambá: não corro nem dou lugar", definiu-se. Ela não se alfabetizou, mas pediu a amigas que escrevessem as cartas sapecas a quem desejasse que a cortejasse.
No ano passado, aos 93 anos, apesar do glaucoma e da catarata, entrou pela primeira vez na vida em uma sala de aula. Voz alegre, justificou: "Quero ler o mundo e ter menos bocas faladas". Raimunda não estava cansada das pessoas, nem nada, queria mesmo era o silêncio reflexivo, só desejava brincar sozinha com o seu pensar.
quarta-feira, 6 de junho de 2007
Eu só quero é ser feliz...
Duzentos e quarenta horas sem voz, sem letrinhas, sem carne. A falta dele esmaga, altera a vida. Desabafo minha angústia em preces solitárias no altar que imagino na minha cama. Há todo um método. Janela aberta, luz, santinhos em ordem: Santa Rita, São Judas Tadeu, Santo Antônio, Nossa Senhora Desatadora dos Nós, São José. Meus deuses, o que faço com essa saudade toda? A religião sempre esteve presente em nossas trocas. A última frase que ouvi dele: Deus te abençoe. Religião, do latim re-ligare, religação. Não dá, não.
Lamento a minha coitadice. Dez dias de condenada, sofrendo com o encarceramento dos sentimentos, riscando pauzinhos na porta do quarto, imaginando quantos serão necessários para a paz que trazem o esquecimento e o desapego. Estabeleci como meta de cura 1.200 horas, menos de dois meses, acho que está de bom tamanho para a tristeza. Processo rapidamente todos os sentimentos. Tenho dormido, em média, três horas e meia. Também não como direito porque ainda rumino suas palavras pesadas.
Ele me pediu a liberdade como prova de amor. "Se eu amo alguém, quero que seja feliz mesmo longe de mim". É isso que estou fazendo, é a minha prova de amor a ele, a prova de amor que ele não soube me dar quando tantas vezes, antecipando esse desfecho siberiano, pedi que me deixasse sair em paz da relação. Ele sempre voltava com músicas, declarações, ligações na madrugada. Agora entendo por quê. Não era amor, mas uma variação disso sem nome.
Choro na rua, no quarto, no trabalho, no banho (muito no banho, pelo desamparo da nudez e pela água). O caminho para chegar ao jornal é uma maratona de recordações. Se vou pelo Túnel Santa Bárbara, passo em frente ao prédio dele, e, se não der a sorte de o sinal estar fechado, na porta do Snob - tão freqüentado por nós, que a recepcionista até nos dava a chave do mesmo quarto, sem perguntar nada. Pela Mem de Sá, pago mais caro e me encho de saudade do cabrito do Capela. Tudo ficou para trás, mas carrego as lembranças como um rabo, não consigo arrancar, fazem parte do que eu sou.