segunda-feira, 30 de novembro de 2009

Sonhos voltam a rondar. Aproximam-se, farejam e fogem. Sou eu que os assusto. Eu e o meu medo de doer.
Em breve, vão se deixar tocar. Meu Deus, como desejo esse dia.

quarta-feira, 18 de novembro de 2009

terça-feira, 17 de novembro de 2009

Terremoto no Canadá

E eu embarcando para lá. Parece que busco as catástrofes, como se a vida harmônica não tivesse sua graça. Desafios, paixão. Tudo o que vem rápido passa voando e isso me excita. Não posso me queixar de monotonia. Amo a vida e sou tentada pela morte.

quarta-feira, 11 de novembro de 2009

Blecaute interior

Subo a pé os sete andares até meu apartamento. Corro jamaicanamente das lembranças inquietantes que o blecaute na cidade me causa, mas sou ultrapassada e bloqueada por elas. Vejo-me na mesma cena, em outra época. O calor, a falta de luz, a escada, a falta de ar, as elucubrações, a falta de você. Voltava da rua sozinha, enquanto um dilúvio escurecia e encharcava as ruas. Havíamos combinado assistir ao show da Rita Lee. Você não apareceu. Da porta do Canecão, debaixo de chuva, liguei enlouquecida para seu celular umas 380 vezes. Enquanto isso, já ia me imaginando lá dentro, esgoelando-me junto com a ruiva nos versos "juro que não vai doer se um dia eu roubar, o seu anel de brilhante, afinal de contas dei meu coração, e você pôs na estante...". Blergh. Graças ao breu total, a apresentação foi impossível naquele sábado.
Coração apertado, lágrimas misturadas à chuva, me arrastei miseravelmente até minha casa com dois ingressos válidos para o dia seguinte e dormi o sono pesado que nos defende da dor.
Você me ligou de madrugada. Não atendi. De manhã cedo. Suspirei um alô. Havia pedidos de desculpas na voz ainda embriagada, "foi meu apagão, amor", e palavras apaixonadas. Sim, eu ainda o queria por mais um breve tempo.

segunda-feira, 9 de novembro de 2009

Emoção

Noite de 16 de abril de 1994. O telefone tocou ao lado da cama. Era meu amigo Ivan com um convite quase irrecusável: "Silvia, vambora ver o Chico Science no Circo Voador".
Fiquei tentada. "André, o Ivan está chamando a gente para ir ao Circo". Olhei para a minha barriga de 42 semanas de gravidez. "Acho melhor não, né?".
Declinamos, tristemente. Na madrugada do dia 17, comecei a sentir contrações e Laura nasceu.
No último sábado, 15 anos e sete meses depois, o Nação Zumbi, sem o Chico Science, morto em 1997, voltou ao Circo para show com as músicas do disco Da Lama ao Caos, o mesmo que eu havia perdido por causa do fim da gravidez. Dessa vez, estava lá misturada à massa que ocupou a lona. Calor congolês. Pulei, levei pisada, suei. Adolescente eu, adolescente tu. Jorge Du Peixe e Lucio Maia me arrepiaram. Uma cerveja antes do almoço é muito bom pra ficar pensando melhor.

quarta-feira, 4 de novembro de 2009

Lua do Custódio Coimbra

Pequeno conto

Felipa acordou com sede de Antonio. Da última vez que se encontraram, ela o apertou como ao último tubo de pasta de dente da casa, já vazio, obcecada por retirar dele o que era necessário, mas sem esperança. Preferia não saber quantos dias havia se passado desde o abraço, porque tempo de ausência contabilizado é dor certa.
Vestiu-se e partiu para o trabalho impregnada de perfume seu - que tinha sido dele, pensou.
Sonhava Antonio na rua ensolarada e nem percebeu o impacto. Quando um anjo lhe deu colo, Felipa conseguiu enxergar seu amor entre o Cristo e o mar. Os que a viram depois contam só se lembrarem do sorriso no chão.

domingo, 1 de novembro de 2009

Vozes do além

Não sei não, mas parece que o mundo está cheio de esquizofrênicos. É um tal de ouvir coisas que nunca foram ditas que dá até medo. Em uma semana, duas amigas e um amigo vieram contar em lamúria que as pessoas com quem se relacionavam tiraram o corpo fora com a desculpa de que "as expectativas eram diferentes". Como já ouvi essa ladainha, perguntei a eles se haviam explicitado aos parceiros o que queriam nos respectivos envolvimentos. Nada, foi a resposta de todos. Nunca falaram em namoro, juntar trapinhos, filhos. Apenas pretendiam "viver bons momentos". Foi aí que descobri que essa expressão aspeada aparece no dicionário dos assustados como sinônimo de "compromisso", palavra realmente forte para quem está indeciso sobre seus caminhos. Bom, não vou tentar entender a cabeça alheia, seria enorme presunção, mas o que me chamou a atenção nos casos contados é que em todos havia muito desejo entre os casais. Lamentável saber que as pessoas não arriscam.
Para ilustrar, transcrevo uma conversa na praia, há muito tempo, com S., amigo antigo, que tinha os olhos brilhando de paixão quando me encontrou.
- Menino, soube que você está namorando.
- Não, Ana Silvia, não é bem namorando.
- Então é o quê?
- Ah, estou saindo com uma mulher.
- Saindo, dormindo, amando. Olha só seu sorriso, amigo. Isso é sorriso de felicidade. Ela é legal?
- Ela é maravilhosa.
- E o que falta para namorar?
- Como vou saber que ela é A mulher para mim?
- Acho que não vai saber.
- E se eu arriscar uma relação séria com ela e deixar passar a mulher da minha vida?
- Não acredito que exista O alguém na vida de ninguém. Mas o que você quer de alguém em relação a você e de você em relação a alguém?
- Não sei.
- Tem medo?
- Medo de me perder.

Sophia de Mello Breyner Andresen

A hora da partida

A hora da partida soa quando
Escurece o jardim e o vento passa,
Estala o chão e as portas batem, quando
A noite cada nó em si deslaça.

A hora da partida soa quando
as árvores parecem inspiradas
Como se tudo nelas germinasse.

Soa quando no fundo dos espelhos
Me é estranha e longínqua a minha face
E de mim se desprende a minha vida.

E continuo a depositar flores roxas...


... no porta-retrato onde não estás