domingo, 24 de junho de 2007

Tudo como dantes (tá ficando chato)

Na rodada diária de consolos, ouvi um tristíssimo: "Tem uma hora que o corpo cansa de sofrer e você esquece". Pois é, impotência pura. Deixa que o tempo se encarrega, nada está nas suas mãos. O corpo arqueia cansadíssimo, sem relaxar nem esquecer por enquanto. Admito que muita coisa está mudada, mas a visão que tenho de mim é a de um trabalho de patchwork - retalhinhos de lembranças, objetos, sons, cheiros e sabores.

A sensação de solidão mesmo entre amigos amados é de enlouquecer. Eles cantam, embalam, ritualizam as exéquias, direcionam os lamentos, sofrem e xingam com e por você. Queridos que dão as mãos. Mas é verdade o que está escrito embaixo: a água dos olhos nunca tem sono. Quando eles se distraem, a dor toma conta, e não há analgésico. É apertar os dentes, enrijecer a musculatura e esperar passar. Pergunto ansiosa quais serão as seqüelas, porque nada dói tanto impunemente.

E, sobre as passagens dos passamentos, aí vai uma historinha. Conta uma lenda que, um dia, o rei David pediu ao joalheiro real que lhe desenhasse um objeto que fosse útil tanto na adversidade quanto na prosperidade. Sem idéias, consultou-se com um sábio, que lhe disse para fazer um anel e nele escrever as palavras "isto também passará". Dessa forma, quando a vida fosse um mar-de-rosas, a jóia evitaria que o rei ficasse muito cheio de si e, portanto, vulnerável aos baques. Porém, quando uma tragédia o atingisse, contemplaria a inscrição e apenas esperaria.

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