terça-feira, 18 de dezembro de 2007

Assim comecei...

Eduardo Ronderos delirava, contando os segundos com piscadelas no quarto todo branco de cal. Não era febre, mas vergonha, uma ferida inflamada resultado da opressiva quase derrota imposta pelo seu último inimigo, o tempo. Estava paralisado, imóvel na grande cama de lençóis brancos, subjugado pelo poderoso adversário. Lembrou-se, entre micromomentos de calma escuridão, das palavras da centenária Úrsula. “O tempo não passa, ele gira em círculos”. E sorriu dentes amarelos em contraste com a saliva. Eu vou vencer!, ensurdeceu sua voz toda a estância na velha Santa Fé de Antioquia.
Esticou a mão e alcançou os pequenos papéis deixados na mesa ao lado da cama pela filha Clara, sua bênção, a mais bonita das quatro, a mais dedicada dos sete que vingaram. As imagens impressas de Santa Dinfna e Santo Pelegrino e uma foto de Clara, além dos dentes de Ronderos, quebravam a uniformidade branca e insana do quarto. Eram sua platéia bizarra.

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